Ricardo Moscatelli

O discurso antiambiental 

Ricardo Moscatelli

Publicado

há 1 ano

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O discurso antiambiental 

Foto: Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real

O discurso antiambiental sempre foi financiado.

Nós, humanos, somos incríveis em nossa capacidade de fazer o bem ou o mal. Mas veja, você consegue identificar o que é o mal? Logicamente, ao refletir sobre isso você deve ter imaginado o mal como algo ou alguém que está fora de você. Ou, num outro sentido, como disse Sartre, “o inferno são os outros”.

Acredito que a maioria das pessoas busca ser boa. Desde o sentido mais raso, que é o daquela pessoa que entende que, se não está fazendo nenhum mal para outrem, quer dizer que ela é boa (ou se sente boa), até o caso das pessoas que dedicam suas vidas a ajudar outras pessoas ou causas. Pela minha interpretação, as pessoas consideradas más são aquelas adormecidas, que não se ligaram “do todo”, que não têm a capacidade de perceber o que é a vida em sociedade ou em comunhão com outras vidas, que se tornaram incapazes de sentir a dor ou sofrimento do outro indivíduo, seja o outro indivíduo uma pessoa ou um animal (que também sente medo, frio, dor, fome - como nós).

Dentro desta categoria está o egoísta, que entre outras coisas, é aquele que pensa primeiramente no próprio conforto ou no de seu grupo. Grupo este que, por fim, o beneficiará de alguma forma, voltando então para o conforto individual. Para mim, o egoísmo está intimamente ligado ao que entendo por “mal”.

Feita essa introdução você já parou para pensar como recebemos o tempo todo algum tipo de influência para gostar ou não gostar de alguma coisa, travestindo-a de boa ou má?
Já parou para pensar o quanto há de empenho para que você assuma uma posição, para que você se una ou comungue com uma linha de pensamento? Neste momento, começo a falar das coisas de impacto coletivo, como produtos de multinacionais, de meios de vida, de ideias coletivas etc.

Trazendo para minha área de interesse e de estudo (e para um caso concreto), há alguns meses recebi de alguns amigos um vídeo onde um professor da USP dizia que o aquecimento global era uma farsa e, nas entrelinhas, que o meio ambiente é um entrave ao desenvolvimento... Não bastasse a comunidade científica em peso discordar disso, e apresentar provas de que um aquecimento global está acontecendo, inclusive causado pela influência humana, recentemente uma reportagem da BBC, (que não é nenhum grupo de WhatsApp ou vídeo sem autor conhecido) comprovou que o referido professor, foi contratado para desacreditar o aquecimento global. Sim, ele virou um produto...

A matéria da BBC, “(...) A reportagem contou ao menos 20 palestras do tipo (...) nos últimos três anos feitas por Felicio e por outro professor. [A palestra citada na reportagem] fez parte de um circuito universitário de um total de 11 palestras com o nome "Aquecimento global, mito ou realidade?" em nove faculdades e dois sindicatos no Mato Grosso. Todas elas foram bancadas pela Aprosoja Mato Grosso, a associação de produtores de soja e milho do Estado, maior produtor de soja do Brasil(...)”. A reportagem está disponível no site da BBC em Português.

Quando recebi esse vídeo, “macaco véio” que sou, fiquei duvidando desse personagem e, sempre que recebia esse vídeo, apresentava contraprovas para meus amigos “conservadores”, até que veio a constatação da contratação do indivíduo pela Aprosoja. Financiado, pago para falar o que falou, na contramão da Ciência e de provas contundentes.

No Brasil, a maior causa de emissões de dióxido de carbono é o desmatamento feito para expansão da agricultura e da pecuária. A soja e o gado de corte são protagonistas desta triste história.

No bioma predominante de nossa região (Metropolitana de SP), da floresta atlântica original, hoje restam menos de 12% do que havia originalmente. Isso está longe de representar algum equilíbrio entre homem e meio ambiente, se é que poderíamos separar as duas coisas.

Não tenho dúvidas de que, se buscarmos equilíbrio, respeitando as áreas de floresta restantes, incentivando a agroecologia e um modo de vida em que se considere a todos, poderemos ter uma condição de vida saudável, farta e alegre para todos. Mas, existe um pensamento contra a ciência, contra o meio ambiente e, atualmente, contra a paz, onde o egoísmo impera e nos coloca cada vez mais distantes de um mundo equilibrado.

Ricardo Moscatelli é pós-graduado em Educação Ambiental, graduado em Administração de Empresas e graduando em Geografia. Tem experiência profissional na indústria, na prestação de serviços, no 3º setor e no setor público, tanto no Poder Legislativo como no Poder Executivo. Morou na Austrália e em Angola, onde pôde observar extremos no desenvolvimento humano em infraestrutura e meio ambiente. Atualmente é Especialista Socioambiental no Instituto Suinã.