Lucas Luiz

Assombração

Lucas Luiz

Publicado

há 3 anos

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Assombração

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Ouvir conversas adultas, quando desautorizadas sempre foi dos grandes dons inerente ao DNA da criança. Amedrontar-se com esses mesmos relatos, sem sombra de dúvidas, o maior.

Nessas elucubrações proibidas, cujo impedimento apenas motiva ainda mais encontrar meios de burlá-lo; minha mãe narrou sobre uma mão surgida do chão chamando-a. Cinco dedos flutuantes de unhas feitas fazendo o movimento — sabe-se lá como — pedindo aproximação. Minha mãe, dentro da coerência esperada, afastou-se o máximo possível. Tremendo.

Foi chocante. Primeiro me dar conta da incrível durabilidade desse esmalte, post mortem, de eficácia comprovada. Embora eu não pudesse precisar a preexistência de testes em pias entupidas de louças. Mas se tratava da mãe. E mães não têm permissão para mentir. Essa prerrogativa está autenticada em sete vias no cartório celestial. Qualquer pequenino de três anos já tem consciência disso. Quanto mais eu, no auge dos meus sete anos, pronto para guerrear contra extraterrestres.

Porque dos medos colossais, apenas a ideia de fantasmas fazia-me paralisar, ainda mais sendo apenas a mão de uma mulher. Como determinar canhota ou destra? Mesmo eu tendo outras obrigações, como defender as pessoas dos alienígenas, a reflexão metafísica sobre a ação da retirada das cutículas fazia-se necessária.

Os marcianos poderiam estar próximos, bem verdade. Porém, toda noite, punha-me em guarda na cama, entre o pai e a mãe, observando o vitrô, procurando qualquer mínimo sinal avermelhado (luzes de discos voadores são sabidamente vermelhas por algum motivo: combustível ou apenas para facilitar a visualização dos nativos). E nada.

Seres provenientes de outros planetas têm pequeno porte. Eu poderia encará-los. Agora convites de mãos aleatórias ficavam em outro departamento.

Então, naquele anoitecer, me coloquei mais cedo na cama, com dois cobertores; acaso surgisse a necessidade de defesa mais incisiva como, por exemplo, cobrir a cabeça.

Infelizmente, a invasão nas horas subsequentes, faria o planeta perder um de seus guerreiros. Entretanto, segurança em primeiro lugar. E ao que parece deu tudo certo. A Terra permanece intacta. Virgem de visitas alienígenas. Exceto se se considerar o testemunho das vacas.

Iniciou com crônicas no Jornal D'Guararema. Recentemente colaborou com inúmeras Revistas Literárias de prestígio, entre elas: A Bacana, Philos, Ruído Manifesto, Subversa e Mallarmargens. Dá pitacos sobre literatura e artes no blog https://poeminhoscult.wordpress.com/ e no https://medium.com/@luscaluiz-46957 . Além de alimentar com poesia o instagram @lucasluiz_ .