Marcio Pereira

Qualificação Técnica nas Licitações

Marcio Pereira

Publicado

há 1 ano

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Qualificação Técnica nas Licitações

Uma das maiores dificuldades da empresa novata em licitações é a comprovação da sua experiência anterior, uma vez que para participar de licitações, notadamente no caso de prestação de serviços, a empresa terá que apresentar atestado de capacidade técnica, emitido por pessoa jurídica de direito público ou privado, e devidamente registrado na entidade de classe competente, como CREA, CAU, etc. Os demais documentos exigidos nas licitações são mais comuns, pois dizem respeito à Regularidade Jurídica, com apresentação dos documentos de identificação, seja da pessoa física ou jurídica, como cédula de identidade ou contrato social devidamente registrado e cartão de CNPJ, Regularidade Fiscal e Trabalhista com apresentação das suas CNDs, Qualificação Econômico-Financeira, com apresentação do balanço patrimonial e certidão negativa de falência e concordata, e a Qualificação Técnica, essa que ora comentamos. Note-se que as demais provas de regularidade são comuns a qualquer empresa, haja vista que toda empresa constituída deve possuir tais documentos, sendo que em sua maioria são disponibilizados na internet, pelos seus órgãos reguladores. 

Ocorre que no caso da qualificação técnica, geralmente as empresas que não são participantes de licitação, não se preocupam em manter um acervo de atestados técnicos, e, quando se interessam por determinada licitação, se veem impedidas de participar da mesma, justamente por não possuir o atestado técnico. Contudo, mesmo as empresas que participam regularmente de licitações, principalmente no caso de serviços de engenharia, ou outro serviço de natureza técnica, muitas vezes têm dificuldade em comprovar a experiência anterior, devido à forma da exigência nos editais, relativa à qualificação técnica, sendo que muitas vezes são colocadas de forma abusiva nos editais. 

Imaginemos um serviço de engenharia civil, onde existe o objeto principal, por exemplo, a construção de uma escola. Logicamente que existirão inúmeros outros serviços complementares, que são comuns e de fácil execução por qualquer empresa de engenharia. Todavia, seja por desconhecimento técnico ou propositadamente, muitos editais exigem que nos atestados de capacidade técnica e nas CAT (Certidão de Acervo Técnico), devam constar tais serviços complementares, apesar de não possuírem nenhuma relevância técnica ou valor significativo em face do valor total do serviço a ser contratado. Trata-se de uma exigência sem o menor amparo legal. Pelo contrário, ao exigir que se apresente atestado técnico constando esses serviços complementares, sem nenhuma relevância frente ao objeto licitado, o edital fere flagrantemente a Lei, como se infere do disposto no artigo 30, § 1º, I, da lei 8.666/93:

“capacitação técnico-profissional: comprovação do licitante de possuir em seu quadro permanente, na data prevista para entrega da proposta, profissional de nível superior ou outro devidamente reconhecido pela entidade competente, detentor de atestado de responsabilidade técnica por execução de obra ou serviço de características semelhantes, limitadas estas exclusivamente às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto da licitação, vedadas as exigências de quantidades mínimas ou prazos máximos”  (g.n)

Importante mencionar que a identificação do abuso do edital deve ser feita antes da abertura da licitação, para que haja tempo suficiente para impugnar o edital. Há que se mensurar qual seria o percentual relativo àquele serviço que está sendo exigido no atestado, em face do valor do objeto, para demonstrar a sua irrelevância. A Lei atual, Lei 8.666/93, não menciona esse percentual, cabendo ao julgador aplicar a norma a cada caso concreto. A Nova Lei de Licitações, Lei 14.133/2021, que entrará em vigor definitivamente em abril de 2023, fez constar qual seria o percentual de relevância para permitir a exigência desses serviços, definindo em 4% em relação à contratação, como se infere do seu artigo 67, § 1º:

1º A exigência de atestados será restrita às parcelas de maior relevância ou valor significativo do objeto da licitação, assim consideradas as que tenham valor individual igual ou superior a 4% (quatro por cento) do valor total estimado da contratação.

Desta forma, resta clarividente que a Administração não pode fazer exigências que extrapolam o real propósito da licitação, que é o de se contratar com empresa idônea, pela proposta mais vantajosa ao interesse público, sendo vedado incluir cláusulas restritivas, frustrando o caráter competitivo da licitação, sob pena de nulidade pelos órgãos de controle. 

O advogado, consultor e professor Marcio Pereira formou-se em Direito pela Universidade Braz Cubas, em 1997. Foi pós-graduado em Direito do Estado pela Universidade Gama Filho, do Rio de Janeiro, em 2003. Além de se especializar em Licitações, pela Universidade de São Paulo (USP), no ano de 2002 e concluir o MBA em Políticas e Administração Pública, na Escola Paulista de Direito (EPD), em 2013.

Além de consultor e assessor jurídico, Marcio foi professor universitário entre 2007 a 2010, na FaculdadeS Metropolitanas Unidas (FMU)