Guararema

O apagar de todas as luzes

José Freire

Publicado

há 5 anos

em

O apagar de todas as luzes

- Marta, Marta, tu te preocupas e te inquietas com muitas coisas quando uma só é necessária (...) (Lc 10,41).
Essas palavras de Cristo reverberaram em minha mente no último Domingo, quando o Centro da cidade ficou às escuras devido à queda de energia.
Imediatamente, minha reação foi de desânimo e angústia. Ficar sem luz seria inconveniente. Entretanto, gradativamente, cresceu dentro de mim uma paz que tomou conta do meu ser: passei a respirar mais lentamente, sentir o vento batendo contra meu rosto e perceber o brilho da Lua e das estrelas. Além disso, interagi melhor com as pessoas ao meu redor e deixei de lado meu celular. É notável o impacto do domínio que a luz teve sobre o homem. Até meados do século XIX, a maioria das pessoas dormiam cedo porque não havia muito o que fazer após o anoitecer. A ausência de muitas opções para divertimento era um convite para o exercício da imaginação nos momentos de lazer e uma oportunidade singular de se praticar uma virtude esquecida: a simplicidade. Com a luz, não somente isso mudou, mas o homem passou a estar num estado de alerta contínuo: a luz excita nossos sentidos mantendo-os despertos e possibilitou que momentos outrora de descanso tornassem-se ocasiões de lazer ou trabalho. 
O domínio da luz possibilitou avanços tecnológicos que beneficiaram várias pessoas materialmente, desde de carros até smartphones. Contudo, o progresso tem uma lei inexorável: a satisfação de uma necessidade cria um novo problema. Exemplo: com a internet, cria-se o problema da inclusão digital àqueles sem acesso. Num mundo sem internet, o problema da inclusão digital jamais surgiria. Ou seja, uma sociedade perfeita é impossível: toda solução para um problema cria um novo. Para atenuar esse paradoxo do progresso, talvez um dos remédios seja algo sabido por todas as tradições espirituais sérias: desprendimento.
Como proceder então? Comece pelo seguinte exercício: fique um dia sem usar Whatsapp. Se pensa que isso é impossível, sinal de que você precisa disso urgentemente. Qual foi minha reação quando a luz retornou no Domingo? Fiquei um pouco chateado, pois estava curtindo a escuridão e o silêncio. Parece-me que então entendi a frase que completa a de cima: Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada (Lc 10,42).
Qual é a melhor parte que você está perdendo por estar entretido com tantas outras?

José Freire Nunes é  um jovem de 24 anos, que se formou na Universidade de São Paulo (USP) no ano de 2016 no curso de Direito. Atualmente, atua como mentor educacional. Freire, fez cursos no Canadá, Estados Unidos e Inglaterra.  Os cursos consistiram em seminários de verão de 4 dias a até 15 e cursos de inglês de até 4 semanas. 
Os cursos ocorrerem na Universidade de Cambridge (UK), Universidade de Harvard, Universidade de Yale e Bryn Mawr College.