Célia Maria

Tempo é dinheiro?

Célia Limongi Sterse

Publicado

há 3 anos

em

Tempo é dinheiro?

Reprodução

A sociedade americana, no afã de construir, de acumular riquezas, propagou o slogan “tempo é dinheiro”, que, repetido à exaustão tornou-se uma afirmação aceita por muitos. Verdade incontestável, dizem os materialistas, para quem tudo se resume na posse de bens materiais, obtidos quer através do esforço mental, quer do trabalho físico.

Não é de se estranhar que  essa seja  a pátria do fast food, dos mac donalds em que se estabelece um tempo reduzidíssimo para se preparar um sanduíche. Montaner, jornalista e escritor cubano, radicado nos Estados Unidos, conta que, um dia, às três horas da manhã, estava num supermercado e viu com espanto que, naquele estabelecimento comercial, uma filial bancária negociava a hipoteca de uma casa para um cliente sem sono.

Não se pode , absolutamente, perder tempo numa sociedade de muito trabalho, sem fronteira entre dia e noite, entre semana e fim de semana. Não é feliz uma sociedade rica, que trabalha mais e talvez melhor que o resto do mundo, preocupada excessivamente em amealhar bens. Cada vez torna-se maior o número de jovens drogados, de casais separados, de suicídios; andam cheios os divãs dos analistas e as clínicas para cura de depressão e estresse.

Como em nosso país se  tenta copiar o modo de vida americano, a ideia do “tempo é dinheiro” já se instalou.  Não há  nem mais tempo para se fazer calmamente as coisas,  nem mesmo para  um almoço tranquilo. Por isso, os self-services  oferecem  rapidez  na refeição. O tempo   dedicado pelas pessoas que trabalham nas cidades grandes a suas refeições, é o mínimo possível, já que  o trabalho está à espera.  Pensa-se : -  tempo é dinheiro, não se pode perdê-lo com  almoços mais demorados, com conversas e outra futilidades.

Se pararmos para pensar mais profundamente chegaríamos a uma conclusão: tempo é muito mais que dinheiro, tempo é vida, e por isso deve  ser encarado como uma dádiva, um grande presente que recebemos todos os dias. Importa valorizar o tempo, não se gastando essa preciosidade apenas com trabalho,  o que é necessário para nossa subsistência e da sociedade em que vivemos, mas também sabendo fruir dos  momentos de tempo que a vida nos oferece.

Dinheiro perdido pode ser recuperado ou aumentado, mas o tempo que passa não volta mais. Essa certeza deveria nortear nossa vida, para que pudéssemos viver em plenitude a nossa trajetória na Terra. Viver intensamente, procurando fazer o melhor, olhando as falhas com espírito crítico para corrigi-las e vencendo-as, construir um futuro melhor e mais feliz. Paradas no caminho são ,por vezes ,necessárias para que se possa refletir como prosseguir com mais segurança. 

Trabalhar, sim, mas ter tempo para viver, para amar, para sentir a beleza, para principalmente conviver. Conviver com a família, com os amigos. Passar momentos de agradável convivência  com o marido, a esposa, filhos, pessoas queridas, jogar até  mesmo“conversa fora”. Essa conversa, vista por muitos como uma grande perda de tempo, pode nos ser benéfica, se aprofunda o nosso relacionamento com o  outro,   nossos conceitos de vida, e  nossos posicionamentos revisados ou aprofundados. Devemos sentir o tempo, não como o inimigo que devora nossos dias, nossa robustez, nossa vida, mas como um aliado, que nos oferece a experiência, a sabedoria prática,  afetos, amores, o belo na natureza. 

Tempo é vida. É olhar a natureza e compreender as etapas pelas quais ela passa, e também pelas quais passamos. O sol nasce, o sol se põe; há um momento de plenitude ,mas também de ocaso, etapas de sua trajetória entre dia e noite, A  escuridão  vence o sol; no dia seguinte, porém, ele ressurge vitorioso para nos alegrar,  aquecer e nos dar outro dia, mais tempo para viver ,para poder ser feliz..... com pouco ou muito dinheiro .

Celia Maria Limongi Sterse, viúva de José Roberto Sterse, avó de 5 netos, tem 3 filhos: Carlos José, juiz; Adriana, oficial de Justiça; e Maria Isabel, biomédica. Formada em Letras Neolatina (USP), Pedagogia (UMC) e Mestra em Língua Portuguesa (PUC SP), foi professora estadual de Português e professora universitária de Língua e Literatura Francesa, Linguística, Língua e Literatura Brasileira, nas universidades UMC, Brás Cubas, Puc (Poços de Caldas) e professora titular de Língua Portuguesa na Universidade  Federal de Mato Grosso do Sul, campus de Dourados.